As sinfonias de câmara de Arnold Schoenberg
A edição de 2021 do Festival Música & Revolução apresenta as duas sinfonias de câmara de Arnold Schoenberg, uma referência paradigmática do Modernismo Vienense. Essas obras ocupam um lugar particular no percurso desse músico revolucionário. A génese das sinfonias situa-se em Viena na primeira década do século XX. Nessa cidade, os artistas visuais da Secessão Vienense coabitavam com as figuras do Expressionismo emergente. A Arte Nova dava lugar a novas correntes e a música encontrava-se numa encruzilhada. Essa ambiguidade e ambivalência estão bem patentes nas obras de Schoenberg da altura. Entre a harmonia e o contraponto, entre a monumentalidade e a miniatura, entre o tonalismo e o pantonalismo, a abordagem do compositor reflectiu e contribuiu para a transformação da música, amplificada e cultivada pelos seus talentosos alunos.
Um curto espaço de tempo medeia a conclusão da Sinfonia de câmara n.º 1 e os primeiros esboços da Sinfonia de câmara n.º 2. A primeira foi concluída em Julho de 1906 e a segunda iniciada no mês seguinte. Contudo, as obras trilharam caminhos bem diferentes. Nessa época, o tempo de Schoenberg repartia-se em várias atividades, com particular incidência no ensino. A recepção das obras do compositor, que se tornaram progressivamente mais dissonantes, foi complexa. A Sinfonia de câmara n.º 1 foi estreada em Viena em Fevereiro de 1907 e músicos como Gustav Mahler, figura tutelar do Romantismo tardio na cidade, apoiaram os esforços da nova geração de compositores. A Sinfonia de câmara n.º 1 foi escrita para um agrupamento de pequenas dimensões e foca a individualidade dos instrumentos. A obra é uma miniatura altamente contrapontística que condensa elementos expressivos do Romantismo e do Modernismo num curto espaço de tempo. Dessa forma, contrasta com o culto da monumentalidade em voga, patente nas sinfonias de Mahler e em obras do próprio Schoenberg, como Pélleas und Melisande ou os Gurre-Lieder. Schoenberg recorre a uma linguagem que mantém um centro tonal, mas que integra elementos estranhos a esse sistema, criando momentos de intensa expressividade. Posteriormente, o compositor arranjou a obra para orquestra sinfónica e dela fez duas versões, uma em 1922 e outra em 1935.

Em 1933, Schoenberg fixou-se nos Estados Unidos da América. Afastado de cargos docentes pelas autoridades nazis, manteve uma intensa actividade pedagógica no país de acolhimento. Contudo, o contexto cultural americano não o seduziu e o compositor alimentava a vontade de emigrar. Nessa época, dedicou-se à revisão de algumas obras e à escrita de materiais pedagógicos sobre composição, que ainda hoje fazem parte da bibliografia essencial da disciplina. Após um longo período de pousio, Schoenberg retomou os esboços da Sinfonia de câmara n.º 2 na segunda metade de 1939. Ao contrário da expressividade romântica da primeira obra, Schoenberg abordou essa sinfonia através de um prisma clássico. Dessa forma, a dissonância e a tensão são apresentadas de forma mais contida do que na Sinfonia de câmara n.º 1. Dividida em dois andamentos, marca um período de relativa inactividade do compositor, que redescobriu a identidade judaica com a ascensão do nazismo, processo paralelo ao retorno pontual ao tonalismo encarnado nas obras de juventude. A Sinfonia de câmara n.º 2 é uma revisitação, numa fase de maturidade, de uma peça que antecedeu as experiências mais radicais de Schoenberg. Nas palavras do próprio compositor: “Um desejo de regressar ao estilo antigo foi sempre poderoso em mim; e foi forçado a abandonar-me a essa vontade de tempos a tempos. Portanto, ocasionalmente, componho música tonal.”
Saiba mais sobre o Festival Música & Revolução, de 23 a 25 de Abril 2021, na Casa da Música: https://info.casadamusica.com/musica-revolucao-2021